A direção virtuosa de Regina King faz de “Uma Noite em Miami…” um triunfo

Caio Coletti
2 min readFeb 16, 2021

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UMA NOITE EM MIAMI… (One Night in Miami…, EUA, 2020)

Há uma leveza e um dinamismo em “Uma Noite em Miami…” que se certifica de que o filme não traia a sua origem teatral, em nenhum dos dois sentidos do verbo: no primeiro, que não traia a peça original ao se desviar demais dela na gana de provar a sua estatura como cinema; e, no segundo, que não se traia como simplesmente um “teatro filmado”, em um equilíbrio muito mais complicado de se explicar.

No fim das contas, está tudo nas mãos de Regina King — e este é apenas seu filme de estreia! A premiadíssima atriz de “Watchmen” e “Se a Rua Beale Falasse” mostra o seu faro para interações, para traduzir as dinâmicas entre múltiplos personagens em movimentos e expressões, manipulando as ferramentas do cinema (fotografia, trilha, edição) para revelar-nos, com a câmera, subtextos e contextos que o palco não é exatamente capaz de revelar, por sua própria natureza.

Com extraordinária habilidade e honestidade, King imprime em seu filme múltiplas verdades: a de cada um dos quatro homens negros retratados nele, a da época em que eles viveram, e a da época em que nós os assistimos. “Uma Noite em Miami…”, como escrito por Kemp Powers e registrado por King e por seu time criativo, é um filme polímata, mobilizador em vários sentidos, especialmente por sua abertura conceitual e emocional a formas diferentes de perceber o mundo e agir a partir dele.

No centro nervoso dessa mobilização estão os quatro atores principais de King, que se equilibram, se completam e se elevam em cena de maneira harmoniosa. Eli Goree é uma explosão de carisma como Cassius Clay, o futuro Mohammad Ali, em uma performance de astro que contrasta com o nervosismo quieto e eficiente de Kingsley Ben-Adir como Malcolm X. Enquanto isso, um imponente e estoico Aldis Hodge cria um Jim Brown conciliador que se choca contra o conflituoso e insinuante Sam Cooke de Leslie Odom Jr. — um ator cujo talento óbvio está em criar antagonismo sem criar antagonistas.

O embate mais simbólico do texto de “Uma Noite em Miami…” pode ser entre Malcolm e Sam, mas o filme de King é capaz de enxergar além disso para submergir-nos no que conecta todos os seus quatro protagonistas uns aos outros, ao mundo, ao tempo, e à nós. Como obra de arte, é uma experiência esclarecedora, revigorante e crucial.

10/10

Onde ver: Amazon Prime Video.

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Written by Caio Coletti

Jornalista. Repórter do Omelete. Poptimist.

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