“Flora e Ulysses” chuta o cinismo para longe e se esbalda no ridículo

Caio Coletti
2 min readMar 15, 2021

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FLORA E ULYSSES (EUA, 2021)

A Disney, e a cultura pop do século XXI como um todo, tem muito capital (literal e social) investido no mito do super-herói. Torná-lo acessível para todos os públicos, de todas as idades e persuasões, é portanto um bom negócio. Esse é o cálculo corporativista cínico por trás de “Flora e Ulysses”, sem dúvida nenhuma, mas a realidade complicada da arte comercial é que ela existe, em seus próprios méritos, para além (às vezes, a despeito) da ambição financeira do patrão.

Artistas, com raras exceções, sempre tem algo a mais do que fazer um bom dinheiro na cabeça — e esse parece ser o caso da diretora Lena Khan, que em “Flora e Ulysses” toma posse de um roteiro correto, facilmente amável, assinado por Brad Copeland, e o transforma em um “épico” deliciosamente consciente dessas aspas que eu o atribui.

O filme de Khan reposiciona o ridículo e o manjado de sua trama como charmoso; transforma tudo aquilo que o script faz sem pensar muito, no piloto automático, em uma celebração do excêntrico e daqueles que o abraçam na busca de um quê de extraordinário em uma vida ordinária. A diretora traduz “Flora e Ulysses”, que poderia ser só uma Sessão da Tarde barata, em um pedaço de cinema quase insuperavelmente positivo.

No humor, o filme foge da auto depreciação, renunciando (com razão) a buscar a simpatia vazia dos adultos incapazes de embarcar na fantasia da premissa; na ação, abraça a sua escala minúscula e mina o melhor de seus efeitos (práticos e digitais) nem-tão-milionários quanto os das verdadeiras super produções da Disney; no drama, descomplica conflitos sem subestimá-los, e passa uma mensagem direta, eficiente de esperança.

Pode parecer tudo uma questão de equilíbrio e ciência, mas o que Khan e seus colaboradores fazem com “Flora e Ulysses” é mesmo arte. Imprimir um tom, comunicá-lo ao espectador e engajá-lo efetivamente na mentalidade e no ritmo de um filme não é só matemática — há algo de muito humano, e muito mais difícil de acertar, aí no meio.

7/10

Onde ver: Disney+.

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Written by Caio Coletti

Jornalista. Repórter do Omelete. Poptimist.

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