“Moxie: Quando as Garotas Vão à Luta” escapa com habilidade das próprias armadilhas

Caio Coletti
3 min readMar 24, 2021

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MOXIE: QUANDO AS GAROTAS VÃO À LUTA (Moxie, EUA, 2021)

A mão firme de Amy Poehler faz toda a diferença para “Moxie”, o segundo longa da comediante na direção. É ela quem modula cuidadosamente o tom do filme, entre o humor e o discurso social, para abarcar a experiência comum do machismo dentro das (e não descontando as) diferenças gritantes entre suas jovens protagonistas — e, portanto, é ela quem posiciona “Moxie” como um bem-intencionado e generoso pedaço de cinema feminista, e não um produto corporativo que foge das decisões mais difíceis.

Isso porque, no roteiro, “Moxie” passa perto demais de ser essa segunda coisa. Adaptado do livro de Jennifer Mathieu pelas roteiristas Tamara Chestna e Dylan Meyer, o filme centra a experiência de Vivian (Hadley Robinson), uma jovem que começa uma zine feminista em sua escola, inspirada pela juventude ativista da mãe, após perceber o cotidiano repleto de incidentes machistas da instituição. A sua publicação mobiliza um contingente extraordinariamente diverso de mulheres, que começam a endereçar as injustiças que sofrem no dia a dia dentro da escola.

Chestna e Meyer estruturam uma linha narrativa exponencial inteligente para o movimento começado pela “Moxie” de Vivian, culminando no confronto direto de atos de violência grave que permaneciam camuflados por um sistema criado e treinado para camuflá-los. Mais vacilante é a jornada da própria Vivian como personagem, desenhada em altos e baixos que só convencem pela extraordinária elasticidade emocional demonstrada por Robinson — uma performance que cria (muito mais do que o texto) uma protagonista com a qual é difícil não se envolver.

É verdade que, como filme, “Moxie” só se engaja mesmo com a história de Vivian. As companheiras de revolução dela, como a melhor amiga Claudia (Lauren Tsai) e a destemida Lucy (Alycia Pascual-Pena), estão aqui muito mais como avatares das diferentes causas e experiências abarcadas na causa feminista do que como personagens de verdade. Talvez, se “Moxie” fosse uma série, houvesse tempo para mergulhar nelas e entendê-las como seres humanos para além de suas lutas, como conseguimos fazer com Vivian.

Mas é justamente aí que entra a firmeza de Poehler por trás das câmeras. Onde o texto não dá histórias de verdade para ninguém além da protagonista, a diretora parece apreciar suas personagens, e suas atrizes, de maneira intrínseca. Nas mãos dela, “Moxie” se deleita na própria diversidade, na junção dos pontos de vista (e não na sublimação de uns por outros) que formam a força de qualquer revolução, por mais modesta que ela seja.

A fotografia de Tom Magill, e especialmente a montagem de Julie Monroe, sob o comando harmonioso de Poehler, funcionam como um corretivo para o filme egocêntrico que “Moxie” poderia ter sido — mas, gratamente, não é.

8/10

Onde ver: Netflix.

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