“Servant” se tornou uma série maliciosamente, irresistivelmente divertida

Caio Coletti
2 min readApr 12, 2021

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SERVANT, 2ª temporada (EUA, 2021)

O terror doméstico-social enervante de “Servant” faz o cruzamento para o campo da paródia moral metafísica na segunda temporada, revelando o toque delicado do produtor M. Night Shyamalan com a modulação das possíveis tonalidades do gênero (o horror) que construiu a sua carreira.

Com a ajuda inestimável do criador Tony Basgallop e de diretores como Nimród Antal e Ishana Shyamalan (sim, ela é filha de M. Night, mas mostra aqui que não foi parar atrás das câmera só por nepotismo), “Servant” afia a sugestão de crítica social que assombrava os cantos da sua primeira temporada, avaliando os significados por trás do seu título — em bom português, “Servo” — e explorando, com bom humor irrepreensível, os cantos mais escuros do comportamento tipicamente privilegiado.

Nesse pique, a série ainda encontra tempo para reformular o mistério em seu centro como um de salvação, culpa, merecimento. “Servant”, assim, pensa em si mesma como uma avaliação do que significa servir a um código moral, o quanto de humanidade se sacrifica e o quanto se salva por ele. Os seus ritmos excêntricos, embora por vezes alienem o espectador, servem a essa reflexão, à inconsistência ética, à natureza errática da condição humana.

E no coração de tudo isso está uma Lauren Ambrose absolutamente elétrica. Episódio após episódio desta temporada, ela encontra maneiras perenemente surpreendentes de expor facetas novas de sua Dorothy, que ressoam fundo para quem é capaz de se identificar no meio da loucura forçada, imposta, dela. Negação, violência, desengano, confusão, incômodo, angústia, desespero — cada segundo assistindo a Ambrose atuar em “Servant” é uma aventura pelas profundezas assustadoras do que é ser humano.

Isso não significa que a série seja perfeita. Lá pelo meio da temporada de dez episódios, após um começo absurdamente ousado, ela passa algumas horas maçantes perdida na própria trama, tentando encontrar a maneira correta de seguir em frente. Algumas soluções para manter a narrativa dentro da casa dos Turner (necessidade das filmagens na pandemia, talvez, mas também o template da série desde início), enquanto isso, não convencem tanto quanto outras.

Mas, no fim das contas, esses são incômodos pequenos perto da engenhosa, maliciosamente divertida, totalmente surpreendente viagem visual e narrativa que os responsáveis por “Servant” construíram para o espectador. É difícil resistir a ela, e tentar não nos serviria de nada.

9/10

Onde ver: Apple TV+.

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